Paraísos Fiscais: Onde os Ricos Escondem Dinheiro da Tributação


Por Gabriel Gonçalves Nobre,
ilustração retirada da Super (super.abril.com.br)

Desde o doutrinamento da Igreja Católica aprendemos o conceito do paraíso. Conhecido por ser um local ideal, singular e perfeito, o paraíso é julgado por seu cunho totalmente utópico. Porém, nessas avaliações os atores esquecem de alguns simples detalhes. Em primeiro lugar, os seres humanos e sua capacidade imensurável de reproduzir seus desejos no planeta Terra, inclusive na construção de paraísos. Em segundo lugar, o paraíso não é utópico, dado que ele já existe, seus problemas se dão na sua extrema seletividade, acesso aos demais e seu custo incalculável a sociedade. – Fato inesperado é o paraíso ter seu preço para os demais, em nenhuma definição primária o paraíso teve esse fardo.

Sem mais delongas e jogos de palavras, deixo claro que nesse caso estamos falando dos paraísos fiscais. Presumo que o leitor já tenha ouvido falar, mas nunca pesquisado melhor ou tentado entender suas causas e discussões, justamente por isso e por ser um assunto tão interessante trago essa pauta ao blog. No texto de hoje abordo os paraísos fiscais, desde as noções básicas de o que são, para os temas mais complexos de como esses paraísos são prejudiciais ao mundo.

O QUE SÃO OS PARAÍSOS FISCAIS?

Os paraísos fiscais são estados nacionais ou regiões autônomas que tem taxas tarifárias muito baixas para pessoas e empresas. Esses lugares também são conhecidos como refúgios fiscais, pois são utilizados por empresas multinacionais, políticos ricos, milionários, bilionários e parte de classes dominantes para fugir dos impostos locais de onde vivem, justamente por esses locais terem taxas de impostos mais altas quando comparado aos paraísos.

Além de uma baixa ou quase nula tributação, esses paraísos são caracterizados também por seguir uma rígida regra de sigilo bancário e de identidade dos seus clientes, não podendo assim identificar quem são ou de onde são aqueles que querem omitir seus ganhos de determinada região e evadir-se da fiscalidade nacional. Logo, sendo o local preferido dos sonegadores de impostos. Obs: esses locais lucram com baixa tributação em cima de uma renda extremamente alta.

Essas características criam um grande problema a essa era globalizada, o fato de o capital não ter nacionalidade faz com que países percam boa parte de suas arrecadações para os paraísos fiscais, e isso impacta diretamente nas atuações e forças que o Estado pode medir para a manutenção da sociedade. Daí entramos a um novo subtema.

EVASÃO FISCAL: O DINHEIRO PERDIDO PELO ESTADO

Como já iniciado a abordagem acima, os paraísos fiscais são como grandes infernos para as nações alheias, isso porque quando eles são conectados, a nação da pessoa/empresa que aciona deixa de arrecadar a tributação advinda daquela renda que será transferida ao paraíso. Exemplificando um passo a passo, de forma simples e prática seria como: um cantor ganhar milhões de reais em shows no Brasil,  todos os anos, e na hora de fazer seu imposto de renda (como qualquer outro cidadão brasileiro que ganhe mais que aproximadamente 29.000 reais/ano) ele omitir parte dos milhões, pois essa parte estará em um paraíso fiscal com tributos baixíssimos ou nulos, logo, o Brasil perde a arrecadação que está sendo omitida pelo cantor, pois o cantor transferiu o que ganhou em solo brasileiro e terá privilégio sigilo dos paraísos para que esse cantor não mostre sua real quantidade de dinheiro ao governo.

As consequências disso são óbvias, uma baixa arrecadação do governo e uma cobrança indevida comparado ao resto da população, dado que toda população pagará normalmente seus impostos, enquanto a parte mais rica e empresas multinacionais simplesmente sonegarão, mesmo que isso seja crime previsto em leis brasileiras e internacionais. Exatamente, mesmo sendo crime, em ambas as leis citadas há brechas, e com a segurança dos paraísos, fica quase impossível a identificação de quem comete esse crime. Sem entrar em detalhes na possibilidade de o Estado subir a tributação ao resto da população que não sonega, para tentar minimizar a perda.

Além dessas consequências, temos que pensar também no limite de projetos do Estado, uma vez que sem renda, é quase impossível ele atuar com políticas inclusivas e de desenvolvimento mais fortemente, aliás, a tributação é a forma do país arrecadar para assumir seus compromissos fiscais para o desenvolvimento da região.

Atualmente, as regiões dos países emergentes que mais sofrem com essas evasões fiscais, apesar que os desenvolvidos também perdem. Porém, a questão é na participação do PIB, nos países emergentes com menor renda, a taxa que foge da tributação é bem maior em relação ao produto total. Para o leitor ter uma noção, trago aqui uma notícia da BBC [1] que reúne algumas informações que dificilmente foram conseguidas pelos investigadores da área, e previamente aviso: é um problema muito grande.

Estima-se que a África perca mais dinheiro com evasão fiscal do que recebe de ajuda internacional.

“Em um relatório recente, a Tax Justice Network (uma união de pesquisadores e ativistas) estimou que o valor em ativos movimentados em operações nos paraísos fiscais está hoje entre US$ 21 trilhões e US$ 32 trilhões.

Esses são trechos citados da matéria, a surpresa não surpreendente é que todo esse valor vem de 0,2% da população mundial, o mesmo que 10 milhões de pessoas. Além disso, ressalto que pelo menos 21 trilhões de dólares não são tributados em todo mundo, isso é quase 1/3 do PIB mundial (USD 85,9 trilhões em 2018).

HÁ MAIS PROBLEMAS

No entanto, ainda há como piorar, os paraísos fiscais por terem tanto compromisso com sigilos bancários também são duramente criticados como ótimos locais para a aglomeração do dinheiro sujo. Políticos, bandidos, narcotraficantes, todos eles podem acessar esses paraísos sem qualquer impedimento e ainda sim, conseguirem sem barreiras usar os benefícios desses locais para si próprios.

A existência desses refúgios é basicamente um incentivo a qualquer irregularidade fiscal a todo mundo, o fato de passar uma certeza da impunidade faz com que várias pessoas se atraiam aos paraísos e dependa somente de sua ética e moral (o que no mundo capitalista não é muito presente).

SOLUÇÕES AO PROBLEMA

Imagino que nesse momento, depois dessa explosão de informações negativas, meu caro leitor deve estar se perguntando porque caralh*s isso ainda existe. Aproveitando e pegando a onda da dúvida adianto que isso ocorre porque as leis internacionais sobre o capital foram feitas há 100 anos com um mundo muito menos globalizado, por isso, elas são repletas de brechas, na qual bilionários e milionários exploram, muitas das vezes, com uma equipe própria para isso – recomendo o episódio Bilionários da série Descobrindo da 2ª temporada da Netflix, fala exatamente sobre isso.

Entretanto, as organizações internacionais já reconhecem o problema mundial com os paraísos fiscais. A União Europeia, por exemplo, já classifica os paraísos fiscais em listas negras que devem ser observados com cautela. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) trabalha em combate aos refúgios fiscais, e tem até uma equipe com nomes como Thomas Piketty a frente para soluções de minimização de perdas para os paraísos, mas isso daria um novo texto somente sobre tentativas de combate.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com toda a discussão acima, creio que ficaram claros os problemas do paraíso fiscal e a nítida injustiça aos trabalhadores que pagam seus impostos legalmente.

Além disso, chamo a atenção no sentido de esse ser um assunto que tem que ser levado em consideração quando estamos falando sobre tributação, pois diversas vezes vemos voltar em pauta o aumento da carga tributária a população mais rica, o que é correto. Porém, temos que conseguir fazer isso de forma efetiva, com a presença de paraísos fiscais. Não é simplesmente aumentar tributação sobre renda, ou sobre os lucros, já que simplesmente o tributado pode fazer um remanejamento e fugir facilmente desse imposto. Como tudo que tem que ser muito bem pensado, a discussão sobre tributação tem que ser calma e detalhada, para que não haja mais essa omissão por parte de quem verdadeiramente conseguiria contribuir.




Recomendações Finais:
1. Paraísos Fiscais pelo IPEA.
2. Vídeo explicativo no Youtube sobre os paraísos fiscais feito pela Le Monde Diplomatique Brasil.

Comentários

  1. Uma prática tão antiga e ao mesmo tempo cada vez mais recorrida pelos acumuladores de grande riqueza de nosso país.
    Parabéns pelo artigo.

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