DESAFIO AO CONTROLE DA PANDEMIA NO BRASIL: O PRESIDENTE

Por GABRIEL GONÇALVES NOBRE

Bolsonaro em manifestação contra quarententa. Fonte: epoca.globo.com

Temos o pior presidente para este momento? Certamente, se não é o pior, está bem próximo. Nesta terça-feira, 12 de maio de 2020, o Brasil alcançou, infelizmente, 177.589 casos confirmados e 12.400 mortes, sendo 881 acrescentados em 24 horas. Enquanto isso, o presidente da república alterna entre lacrar, criticar a quarentena junto ao seu grupo de militantes, e tentar defender sua família e posto como líder da república. Se quer, ele teve o trabalho de recomendar o uso de máscaras à população. Seria desonesto dizer que Bolsonaro não estaria atuando no cenário proposto pela Covid-19, o problema é que a maioria dos seus atos são, com todo o respeito, desprezíveis. Para legitimar a fala, cito a revista científica The Lancet, que classifica o presidente como “a maior ameaça à resposta do Brasil à Covid-19”.

No dia 6 de maio, o CEDEPLAR/UFMG publicou uma nota técnica de análise das respostas políticas do Governo Brasileiro para enfretamento da COVID-19, disponíveis no Repositório Global Polimap – ressalvo que o Polimap é um grupo de cientistas de todo o mundo com o intuito de auxiliar no caso das políticas públicas. Nesse artigo, como já dito no nome, é feita uma análise detalhada das respostas políticas do Brasil perante o corona vírus, diante disso, trago-o ao blog para servir como referência desse texto, e destaco como uma leitura importante se o leitor tiver interesse em algo mais detalhado.

UM BOM COMEÇO

Apesar de hoje a postura do PR não ser adequada às recomendações, tivemos um início desejável ao combate à pandemia. No dia 30 de janeiro, a OMS (Orgão Mundial de Saúde) declarou emergência de saúde pública global do coronavírus; dois dias antes (28) foi criado o NcoV (grupo de emergência de saúde pública); junto a declaração da OMS, criou-se outro grupo emergencial para saúde pública, sendo esse de caráter interministerial, nacional e internacional; no dia 3 de fevereiro, é declarada situação de emergência em saúde pública pelo Brasil; em 6 de fevereiro é concedido às autoridades o poder de impor medidas de isolamento e quarentena como ações estratégicas de combate ao “corona”; 10 de fevereiro: abertura de crédito extraordinário ao Ministério da Defesa e repatriamento dos brasileiros em Wuhan (epicentro da pandemia); observação: o carnaval não foi cancelado, pois não havia evidências de circulação do vírus no país.

Seguindo o calendário das medidas governamentais contra o Covid-19, percebemos que a atuação do governo brasileiro foi rápida, antes mesmo da chegada do vírus no Brasil, o Estado já se demonstrava consciente do perigo que estávamos prestes a enfrentar. Fora,, de fato, positivas as medidas iniciais, dando expectativas de uma boa atuação contra a futura pandemia (até então, estava em estado de emergência de saúde global) e o compromisso com a comunidade acadêmica.

BOM DEMAIS PRA SER VERDADE

Continuando o calendário já iniciado acima, no dia 26 de fevereiro é confirmado o primeiro caso do vírus no Brasil; no dia 11 de março é anunciado pandemia pela OMS e passa a ser obrigatório, no território nacional, testes do corona vírus aos casos suspeitos. No Brasil, havia 34 casos confirmados no dia anterior; 15 de março, o número de casos se multiplica 5 vezes, tendo então 200 casos confirmados concentrados em SP e RJ. Até então, vemos atuação e displicência do Estado em oposição à pandemia iniciada.

Entretanto, Bolsonaro começava as suas falas de minimização do corona vírus. No dia 10 de março, ele discursa em Miami: “no meu entender, é muito mais fantasia a questão do coronavírus, que não é isso que a grande mídia propala ou propaga pelo mundo todo.”. No dia 17 de março, quando grande parte dos estados brasileiros já estavam declarando quarentena, o presidente diz em entrevista à rádio Tupi: “esse vírus trouxe uma certa histeria e alguns governadores, no meu entender, eu posso estar errado, estão tomando medidas que vão prejudicar muito a nossa economia.”. A partir do início de suas falas, começa-se a perceber a divisão e desunião entre os governantes brasileiros no quesito combate à pandemia. Daí, saímos de um quadro em que estamos dispostos a lutar juntos contra a pandemia, para um quadro em que o principal representante da república desacredita de todas as recomendações mundiais científicas, isso causa discordância e desunião na política brasileira, e pior, incentiva os seus seguidores ao descaso com a pandemia.

Apesar das falas desprovidas de noção, o Estado continuou agindo. Março é o mês com maior desempenho, é responsável pelas políticas de mais impacto para aumento de capacidade de leitos, para a achatação da curva de contaminados, a governança com políticas contra a Covid-19, e a mitigação da contaminação de todo o BR – em destaque o auxílio emergencial. Como segue a imagem retirada da nota técnica da UFMG:


Entretanto, de forma já esperada, as falas do Presidente acarretaram uma crise política. O seu discurso totalmente contra as recomendações da OMS, contra o seu próprio Ministério da Saúde e junto à sua campanha publicitária “O Brasil não pode parar”, só tiveram um fim: a instauração de uma crise de saúde, política e econômica. Em decorrência do desgaste entre ele e Mandetta (ex-ministro da saúde) sobre as medidas de combate ao coronavírus, o ministro foi despedido no dia 16 de abril.

Vale acrescentar que, com raízes no discurso do presidente, uma parte da população também ignorou as políticas de isolamento e também fizeram manifestações na tentativa de espalhar o pensamento de que os riscos enfrentados na pandemia são baixos.

TEMPOS ATUAIS E “O BRASIL NÃO PODE PARAR”

Atualmente, o representante do cargo de Ministro da Saúde é Nelson Teich, porém as relações entre o presidente e o chefe do ministério aparentam continuar de baixa importância, dado que no meio de uma entrevista coletiva, o ministro foi pego de surpresa quando um jornalista o perguntou sobre a classificação de três novas categorias essenciais: academias, salões de beleza e barbearia. Segundo Teich, não era de sua jurisdição a aquisição dessas categorias como atividades essenciais.

Nitidamente, há uma falta de cooperação entre o Chefe de Estado e seu ministro. Declaradamente, o PR está focado e coordenado na a ideia de que o Brasil não pode parar, e a economia tem que voltar a girar, independente do que esteja acontecendo. De certa forma, essas políticas lideradas por Bolsonaro influenciam diretamente o contexto em que estamos e como deve acontecer. Infelizmente, estamos fadados a um descaso público com a Covid-19, e a falta de reconhecimento no que estamos enfrentando deixa as coisas ainda mais complicadas. Enquanto isso, os números estão aumentando e, ainda sim, o nosso principal representante incentiva a volta da economia com discurso nada estudado e visivelmente popular de: “infelizmente, isso só vai acabar quando 70% da população pegar o vírus”; “a economia tem que voltar, pois a crise econômica mata muito mais”; “o vírus só mata grupo de risco e no total só corresponderá 3% da população”.

Nesse momento, o coronavírus está em processo de interiorização segundo a Fundação Fiocruz, talvez, se as medidas fossem mais eficazes no início dessa pandemia, estaríamos em um contexto diferente.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do que foi dito, estamos em uma situação complicada. Claro que a preocupação de Bolsonaro com a economia é compreensível, no entanto, ele não parece entender ou prefere ignorar duas coisas. Primeiro, a quantidade de vidas que poderão ser perdidas pela epidemia é tão importante quanto a própria economia. E, o problema da economia não são as medidas para a pandemia, não é a quarentena, ou o lockdown, ou auxílio emergencial que está desaquecendo a economia, e sim, a própria pandemia. Citando Henrique Meireles, “não é o isolamento que afeta a economia, é a pandemia”. Assim, se a economia não parar agora para o controle do vírus, irá parar mais à frente, ou pelo número alto de mortes, ou pela insegurança da população pela contaminação do vírus.

É necessário ter cuidado com as políticas públicas, sabemos que é difícil tomar decisões nesse contexto, mas não podemos desprezar a ciência.

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